Mais uma travessura do Garotinho!

Publicado no jornal Armas & Política #4 de abril 2001

Abaixo reproduzimos o Decreto nº27775 de 10/jan/2001 publicado no DO do Estado do RJ em 11/jan/2001. Em seguida fazemos alguns comentários sobre o mesmo.

O Governador do Estado do Rio de Janeiro, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, tendo em vista o que consta no Memo nº 2720/1909/99 - SSP,

DECRETA:

Art. 1º - As boates, cinemas, teatros, clubes, estádios, escolas de samba e estabelecimentos congêneres, em funcionamento no Estado do Rio de Janeiro, deverão possuir cofres ou armários com chave, em local de acesso restrito, para o acautelamento de armas de fogo, em conformidade com o disposto na Lei nº 2526 de 22 de janeiro de 1996.

Art. 2º - Os titulares das autorizações de porte de arma de fogo deverão receber, como protocolo pelo acautelamento de suas armas e munições, uma papeleta numerada, contendo o seguinte:

I - nome e identidade, número do porte e órgão emitente, profissão e empregador, e

II - a descrição completa da arma, indicando inclusive a numeração e o calibre e a quantidade de munição.

Art. 3º - A restituição, ao titular da autorização de porte, das armas de fogo e munição acauteladas, ficará condicionada à apresentação do original de seu documento de identidade e da papeleta numerada.

§ 1º - A entrega e o recebimento das armas e munições deverão ser realizados em local diverso daquele em que ficarão acauteladas.

§ 2º - Somente a pessoa que efetuar a guarda das armas e munições poderá ingressar no local destinado ao acautelamento, sendo vedado o ingresso, nesse local, de quaisquer outras pessoas, inclusive o titular do porte de arma.

§ 3º - Os responsáveis pelos estabelecimentos referidos neste Decreto deverão comunicar à Autoridade Policial, no prazo máximo de 48 horas sobre as armas e munições não retiradas por seus portadores, por quaisquer motivos, para que seja providenciada sua apreensão e remessa à Divisão de Fiscalização de Armas e Explosivos - DFAE.

Art. 4º - Os militares da Forças Armadas, Policiais Federais, Policiais Civis, Policiais Militares e Bombeiros Militares, quando no exercício de suas atividades e caso não existam restrições em normas internas de serviço ou em legislação específica, poderão ingressar armados nos estabelecimentos de que trata este Decreto, desde que deixem anotado em livro de ocorrência o nome, unidade de lotação, número da arma e da matrícula, se for o caso.

Parágrafo único: - O livro de ocorrências a que se refere este artigo será de uso obrigatório, terá averbação e fiscalização por parte do Delegado Titular da Delegacia de Polícia da Circunscrição, e conterá: termo de abertura, folhas numeradas em ordem seqüencial, devidamente rubricadas pela autoridade competente, renovado anualmente independentemente de seu término.

Art. 5º - É obrigatória a afixação de cartazes na entrada e no interior dos estabelecimentos de que trata este Decreto, com letras de no mínimo 02 cm de altura e com dimensões de 15 x 30 cm, conforme modelo anexo.

Art. 6º - O Delegado Titular da Delegacia de Polícia da Circunscrição e o Corpo de Bombeiros Militar, no âmbito de suas atribuições legais e institucionais, ao tomarem conhecimento da infringência do disposto neste Decreto, oficiarão à Secretaria de Estado de Fazenda e Controle Geral para aplicação das multas a que se refere o Art. 3º da Lei nº 2526/96, sem prejuízo da adoção das demais medidas cabíveis.

Art. 7º - A multa prevista no Art. 3º da Lei nº 2526/96, terá o valor de 500 UFIR-RJ.

Art. 8º - A Secretaria de Estado de Fazenda e Controle Geral repassará 50% do recolhimento mensal, resultante das multas aplicadas em conformidade com o artigo anterior, ao Fundo Especial da Secretaria de Estado de Segurança Pública.

Art. 9º - O Secretário de Estado de Segurança Pública e o Secretário de Estado de Fazenda e Controle Geral editarão, no âmbito das respectivas competências, os atos complementares que se fizerem necessários ao cumprimento deste Decreto.

Art. 10 - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação revogadas as disposições em contrário, em especial o Decreto nº 22370 de 18 de junho de 1996.

Rio de Janeiro, 10 de janeiro de 2001

Anthony Garotinho

 

Caros Leitores:

Fizemos questão de transcrever a portaria na íntegra, caso contrário vocês poderiam não acreditar que ela existisse. Ela é tão surrealista que pensariam que nós estávamos mentindo. Mas é a pura verdade!

Quem a lê tem a nítida impressão que todo cidadão no Rio de Janeiro anda armado, no entanto, pasmem, existem menos de 200 pessoas com porte de arma no estado (a última contagem de que tenho notícia era de 154 licenças). É bem verdade que essas duzentas pessoas são da Casta Inferior, isto é: aqueles que pagam impostos. E também é verdade que na Casta Superior (aqueles que vivem de nossos impostos [*]) existe um número muito superior a este de portes de arma.

Mas é claro que a lei e o decreto que a regulamenta foram criados para compungir a Casta Inferior, ou alguém pode imaginar o proprietário de um restaurante dizendo: "Perdão Excelência, mas Vossa Excelência tem de me entregar a arma e preencher este formulário antes de sentar à mesa".

Não ria, o assunto é sério!

De fato, não conseguimos imaginar uma situação onde pelo menos uma das condições abaixo sejam satisfeitas, a saber:

A – O proprietário (ou gerente) queira constranger um cliente exigindo que a lei seja cumprida;

B – O cliente queira cumprir a lei deixando sua arma no cofre do proprietário do estabelecimento;

C – Um policial queira preencher a ficha de presença no estabelecimento deixando um registro de sua passagem.

Por enquanto falamos de pessoas que possuem licença para portar de arma, mas e se aparecer no estabelecimento um cidadão armado ilegalmente? Imaginemos, por exemplo, um conhecido contraventor indo almoçar uma bacalhoada no domingo com sua numerosa família e alguns "guarda costas de fé". Que fará o gerente do restaurante? Desprezará a conta gorda arriscando pedir que cumpram a lei? Ou simplesmente fingirá que não sabe de nada?

É óbvio que esta é uma lei feita para não "colar", mas que trará lucros à Fazenda Estadual, pois vão aplicar uma porção de multas (alguns fiscais desonestos também vão se esbaldar).

Por incrível que pareça, a ANPCA torce para que a lei vingue. O Diário Oficial não traz o modelo do cartaz obrigatório, mas adoraríamos ver todos os restaurantes, cinemas, teatros e outros locais públicos com um cartaz do gênero afixado: DEPOSITE SUA ARMA AQUI! Ou então: ESTE ESTABELECIMENTO CONTA COM COFRE PARA GUARDAR ARMAS.

Hoje em dia existem uma série de leis que proíbem a veiculação de propaganda de armas. Estes cartazes espalhados pela cidade serão a melhor propaganda que poderíamos fazer para o uso de armas - e gratuita! Além disso, muitas pessoas pensam que é proibido a todo cidadão portar armas e desconhecem que existe uma licença prevista em lei específica para isto. Estes cartazes alertarão a população que existe uma Casta Superior que anda armada e muitas pessoas sentir-se-ão estimuladas a fazer o mesmo.

Melhor ainda seria se os membros da Casta Superior resolvessem obedecer a lei. Imaginem a seguinte cena: Sua Excelência, sentado à mesa de um restaurante chique, chama o garçom e fala em voz alta para que todos ouçam "Por favor, chame o gerente pois eu quero que ele guarde minha arma enquanto janto!" Em seguida vem o maitre acompanhado do gerente com o livro de identificação e, diante dos olhos admirados dos membros da Casta Inferior presentes, lá vão eles levando o trabuco de Sua Excelência para ser guardado. Sentiram o poder? Sentiram o status? Não poderia haver maior incentivo para o uso de armas. Isto é melhor que "merchandizing" na novela das oito.

Esperamos que o governador Garotinho não ceda à pressão contrária dos empresários do ramo e exija o cumprimento da lei. Torcemos, também, para que a lei seja copiada em outros estados. Já pensaram essa lei em Brasília?

L. Arruda

Diretor da ANPCA

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(*) São brasileiros da Casta Superior aqueles que têm direito garantido em lei ao porte de arma ou ao uso de segurança paga pelo contribuinte, a saber: juizes, promotores, procuradores, defensores públicos, deputados estaduais, deputados federais, senadores, secretários e subsecretários de estado, chefes de gabinete, superintendentes de autarquias, superintendentes de fundações e de empresas públicas, presidentes de estatais, ocupantes de cargos comissionados, policiais, militares e bombeiros.

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