O CORREIO DO CIDADÃO Nº 081

A MÃO É QUE PUXA O GATILHO

divulgado em 01/MAI/99

Nesta edição do Correio deixamos de lado as notícias internacionais para reproduzir o surpreendente (em termos de Brasil) editorial do Jornal da Tarde (São Paulo) do dia 29/abr/99.
Ainda resta um fio de esperança na imprensa brasileira.
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A MÃO É QUE PUXA O GATILHO

Quando ocorre algum fato extraordinário, chamando a atenção do grande público e mobilizando a pauta dos meios de comunicação, os políticos procuram agir rapidamente para dar a impressão de que se preocupam com o que incomoda seus eleitores. Buscam a solução mais fácil e popular, ainda que ela passe longe da solução do problema. Este é o caso da onda "contra as armas" - mas não contra as mãos que puxam os gatilhos - que se levanta em toda a parte e, agora, também no Brasil.

Tome-se o caso da tragédia da escola Columbine, no subúrbio de Littleton, em Denver, Colorado. Ali, dois estudantes trucidaram um professor e 12 adolescentes e se suicidaram. Eric Harris, de 18 anos, e Dylan Klebold, de 17, foram criados numa cultura que reproduz e vende maciçamente a violência, sem questionamentos. Desde a mais tenra infância, consumiram, livre e diariamente, doses maciças de niilismo, brutalidade, perversão e depravação na programação da televisão, na internet, nos jogos eletrônicos, nas canções que ouvem e nos ídolos que cultuam. Seu "guru" é um roqueiro andrógino que sintetiza todo esse lixo, Marilyn (como Monroe) Manson (como Charles, o assassino de Sharon Tate). E daí para passarem a cultuar a memória de Hitler foi um passo tão fácil quanto lógico. Uma sociedade que permite a livre circulação de toda essa porcaria para enriquecer alguns crápulas em nome do princípio da liberdade de opinião terá, agora, autoridade para culpar apenas os instrumentos de que se serviram os produtos desse aprendizado para mostrar o que lhes ensinaram?

No Brasil, também se permite que esse tipo de "cultura" invada as casas das famílias a qualquer hora do dia ou da noite, sem que os pais possam fazer valer seu direito de preservar seus filhos de todo o lixo que se lhes atira sobre as cabeças, com o beneplácito de governos que entregam canais de televisão a todo tipo de trambiqueiro. Há ainda a agravante da miséria, que reduz o senso crítico e já é, em si mesma, uma violência que predispõe à violência. E, finalmente, a generalizada impunidade, que não é só dos ladrões graúdos, mas também do resto dos criminosos, porque não há polícia nem prisões.

Mas, quando a violência virtual, que enriquece alguns, se materializa, sai-se, sempre, pelo atalho mais fácil. Recolham-se as armas! Castrem-se os cães! Proíba-se o jiu-jítsu! Mas permaneçam livres os mercadores de lixo, responsáveis pelo fenômeno, tão obviamente "natural", de transformar o tiroteio na "brincadeira" preferida de qualquer criança de três anos; os donos dos cães programados para matar; os que faturam espirrando o sangue do ultimate-fighting, cuja tradução literal é "luta para exterminar", nas telinhas de milhões de telespectadores. Porque desses canais vêm os votos.

As autoridades que propõem a proibição de armas como solução final para a violência não ignoram que é inviável impedir sua circulação em qualquer lugar e que, se conseguirem, só as dos bandidos sobrarão. Mas, como o material que têm pronto no estoque é hipocrisia, é este mesmo que seguem vendendo.

Copyright © 1999 Jornal da Tarde

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