O CORREIO DO CIDADÃO Nº 076

ENTREVISTA À REVISTA ÉPOCA (NÃO PUBLICADA).

divulgado em 26/MAR/99

Abaixo transcrevemos entrevista concedida ao jornalista Marceu Vieira da revista Época em 21/jan/99.
Esta entrevista ficou guardada até hoje e foi ressuscitada devido a campanha anti-armas do governador Garotinho do RJ. Ao final atualizamos a matéria com comentários sobre a política de segurança do estado do Rio de Janeiro.
A matéria deverá ser publicada na edição deste fim de semana (27,28/mar/99).
Com esse CORREIO nossos leitores poderão comparar o que foi escrito com o que será publicado.
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Prezado Marceu:

Abaixo seguem as respostas entremeadas com as perguntas.
Agrupei as perguntas sobre colecionadores que foram respondidas pelo presidente da ABCA, o museólogo e economista Walter C. Merling Jr.
As perguntas de cunho geral foram respondidas por mim, Leonardo Arruda, engenheiro, editor do ARMARIA e ARMARIA ON-LINE.
Em havendo qualquer dúvida, é só perguntar.

Marceu Vieira escreveu:

> Caro Leonardo.
>
> Agradeço a atenção. Concordo que a entrevista seja feita
> por e-mail. Não há problema.
>
> Seguem algumas perguntas. Sou um leigo completo no assunto.
>
> Por isso, releve se as perguntas parecerem óbvias. Corrija
> alguns dados, por favor, caso estejam incorretos (a
> quantidade exata de armas importadas em 95, por exemplo).
> Lá vão as perguntas:

> 1) A importação de duas toneladas de armas em 1995 chamou a atenção da mídia e provocou a reação do Comando Militar do Leste. Qual foi o desfecho daquele episódio?

R - Nunca houve duas toneladas de armas. O peso líquido era de 1050Kg, o resto sendo apenas caixotes. A reação do Comando Militar do Leste foi de confirmar a legalidade da importação. O estardalhaço foi criado artificialmente pela Polícia Federal e imprensa.

> 2) Por que tantas armas? De que tipo eram?

R - Não eram tantas como a pergunta faz supor, mas apenas a média de 2 armas por colecionador que importou (157 colecionadores e o próprio Exército). Eram pistolas e carabinas representativas do bloco soviético do pós 2ª Guerra Mundial.

> 3) Por que colecionadores importam armas novas? O interesse dos colecionadores não seria por armas antigas?

R - Não conhecemos importações de armas novas por colecionadores. Nossa importação de 1995 foi a única; entretanto eram réplicas de armas já fora de uso. Se o colecionador não preservar as armas novas, jamais existirão as antigas. Nenhum colecionador de automóveis teria um Ford Modelo T se, no passado, alguns não tivessem se interessado em preservá-lo.

> 7) Qual o maior colecionador de armas do Brasil? E do Rio?

R - Em termos de quantidade, o maior colecionador do país mora em Brasília. Em termos de valor ou de representatividade é mais difícil julgar. Uma das coleções mais valiosas do Brasil pertence a família Roberto Marinho. Recentemente pudemos apreciar uma bela espingarda italiana, pertencente a um de seus filhos (Roberto Irineu, se não me engano), em sistema chenapan, lavrada em prata, do século XVII, que foi por nós avaliada em US$20 mil. Poucos colecionadores brasileiros possuem armas desse valor.
Não chega a 400 o número de colecionadores com mais de 50 armas no país, um número ridiculamente baixo considerando-se a riqueza de nossa história e do material que para cá foi importado.

> 8) Onde os colecionadores guardam tantas armas?

R - É preciso entender que basta ter uma arma de uso restrito para ser necessário o registro de colecionador ou de atirador no Ministério do Exército. Portanto, a média de armas entre os 6300 colecionadores brasileiros registrados no Exército é de apenas 17 armas, quantidade muito baixa para os padrões internacionais e que reflete a baixa cultura e o pouco apreço que os brasileiros têm pela preservação de nossa história.
Convenhamos, para essa quantidade de armas não é preciso um local especial. Mesmo assim o Ministério do Exército exige uma série de medidas de segurança para a guarda.

> 4) Quantas armas registradas existem no Rio e no Brasil? E em São Paulo? Há números por estados?

R - Quem pode fornecer o número de armas registradas nos diversos estados é a polícia civil. No Rio de Janeiro é a Divisão de Fiscalização de Armas e Explosivos - DFAE. Cada polícia pode fornecer o número de armas registradas em cada estado. Quando o SINARM (Sistema Nacional de Registro de Armas) vier a funcionar, será possível contabilizar o número de armas legalmente possuídas em todo Brasil.

> 5) Qual a proporção habitantes-armas no Rio e no Brasil?

R - Os órgãos policiais dão como cerca de 2 milhões a quantidade de armas registradas no país. Por outro lado, estimam (não sabemos com qual base) algo em torno de 8 milhões de armas ilegais. Também estimamos que apenas cerca de 5% dos lares brasileiros possuem uma ou mais armas. Não imaginamos que o Rio apresente um quadro diferente do nacional. É nas cidades do interior que a presença de armas de fogo nos lares é mais comum.
Não é, portanto, devido a existência de um grande número de armas que ocorrem muitos crimes com armas no Brasil. O problema é que elas estão em mãos erradas.

> 6) Qual a cidade mais armada do Brasil? Está lá também o menor índice de crimes?

R - Em termos absolutos é São Paulo, por ser maior e possuir maior poder aquisitivo. Devido a baixa densidade de armas entre a população brasileira é difícil uma cidade se destacar neste campo. Podemos afirmar que a prática do tiro ao alvo e da caça é mais comum nos estados com imigração alemã (européia em geral). Santa Catarina e Rio Grande do Sul aí se destacam. Entretanto, como a maioria dos brasileiros que possui arma é para defesa pessoal, essas atividades esportivas não são um bom indicador da quantidade de armas na região. Como você pode perceber, faltam no Brasil estatísticas confiáveis sobre o assunto. Se o governo as tem, as mantém em segredo.

Até alguns anos atrás São Paulo apresentava criminalidade menor que o Rio de Janeiro. Acreditamos que isso era devido ao maior número de cidadãos portando armas. Com o governo Mário Covas, os portes foram cerceados e os índices de criminalidade estão subindo continuamente. A permanecer esta política, brevemente, São Paulo vai ostentar o título de cidade mais violenta do Brasil.

>9) Quais são as armas nacionais? Onde são fabricadas?

R - Só restaram quatro grandes (grandes em termos de Brasil, bem entendido) fabricantes de armas no Brasil. São eles a Taurus (a maior), a Rossi, a IMBEL (estatal) e a CBC (Cia. Brasileira de Cartuchos). Existem também a Urko e a Boito, que trabalham quase que artezanalmente. As demais (INA, Castelo, Ubal, Caramurú, Chapina, etc.) fecharam com o tempo e as seis que restaram não estão financeiramente muito saudáveis. A Taurus, Rossi e Boito estão localizadas no Rio Grande do Sul, CBC e Urko em São Paulo e a IMBEL em Minas Gerais.

> 10) Qual é o maior exportador de armas para o Brasil? Quem é o maior importador brasileiro?

R - A importação legal de armas para o Brasil é muito pequena - até mesmo para as corporações militares. Há um importador no Rio Grande do Sul (Rossi de Moraes) e outro em São Paulo (REALIZA), mas suas vendas não são expressivas, seja em números absolutos, seja comparando com a produção nacional.

> 11) Há uma estimativa sobre o número de armas ilegais no país? Qual a principal porta de entrada do contrabando?

R - O número de armas ilegais já respondemos acima. Quanto ao contrabando, o melhor é consultar a Polícia Federal sobre este assunto. A lógica diz que não deve existir no Brasil a figura do grande contrabandista de armas que a imprensa alardeia. Afinal, é um produto caro, com pouco mercado, pequena margem de lucro e impossível de se anunciar. Sem dúvida, o risco não vale o investimento.

> 12) Tem fundo de verdade ou é mito a crença generalizada de que os bandidos estão mais bem armados do que a polícia?

R - É mentira. O conhecimento que temos sobre armas em geral, contrapondo-se ao que as reportagens apresentam como apreendidas com bandidos, nos leva a esta afirmação.

> 13) Qualquer estatística sobre o assunto armas no Brasil e no mundo nos será bem-vinda.
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Abaixo seguem alguns dados e estatísticas:

A pergunta abaixo foi feita pelo Jornal da Tarde, de São Paulo, mas nem a pergunta nem a resposta foram publicadas.

P - Pesquisa divulgada pela ONU no ano passado apontou o Brasil como o país campeão em porcentagem de mortes causadas por arma de fogo com o índice de 26,5 mortes em cada 100 mil habitantes, uma taxa 5,5 vezes maior do que a média mundial. O Japão está no lado oposto, de acordo com o estudo o Japão é o país com menor taxa de mortalidade envolvendo armas de fogo 0,05 por 100 mil habitantes. Além da porcentagem de mortes há outra grande diferença entre os dois países: a legislação. No Japão, o cidadão comum não pode ter arma de fogo. No Brasil, ao contrário, basta ter 21 anos para poder comprar uma arma de fogo. A diferença na lei não seria o argumento em favor da tese contrária à sua, ou seja, ao armamento da população?

R- Essas pesquisas não têm nenhuma relação com a posse legal de armas. A maioria desses homicídios ocorreu em confrontos com a polícia ou brigas de quadrilhas. O dado que nos interessa é: quantos crimes foram cometidos por cidadãos sem passagem prévia pela polícia? quantos desses homicídios foram cometidos com armas registradas? Se esmiuçarmos a fundo esses dados veremos que esses casos são raríssimos. Esses números apavorantes só mostram que temos um sério problema de banditismo. O cidadão comum não mata. A posse de uma arma não transforma ninguém em assassino. Mas, quero lembrar que essa mesma pesquisa da ONU apresenta erros crassos. Por exemplo, eles dizem que o país mais armado do mundo é a Alemanha, o que não é verdade, e um país como a Jamaica, com alta taxa de assassinatos políticos, nem aparece na relação. Que credibilidade têm esses números? Quanto ao Japão, é bom lembrar que a Yakusa (a máfia japonesa) anda muito bem armada e que com 500 dólares na mão é fácil comprar uma pistola chinesa nas ruas de Tóquio (segundo o NY Times). Certamente não é por falta de armas que não acontecem crimes no Japão.
Lá como cá existe um mercado negro de armas que abastece a marginalidade. Lá como cá os criminosos adquirem suas armas por meios ilícitos. Aliás, no Brasil, uma arma no mercado negro costuma custar menos da metade do que sua similar no comércio legal, tamanha é a abundância. A culpa disso é da política de armas equivocada do governo.
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Percentagem de armas em residências nos países mais armados do mundo (dados de 1991).

1 - EUA - 48,9% dos lares possuem armas.
2 - Suiça - 32,6%
3 - Noruega - 31,2%
4 - Canadá - 30,8%
5 - Finlândia - 25,5%
6 - França - 24,7%
7 - Austrália - 20,1%

Nenhum dos países acima apresenta altos índices de criminalidade, o que comprova que o problema não está nas armas mas sim em quem as possui.
Há uma diferença importante entre a Suiça e os demais países - o Canadá, por exemplo. Na Suiça todo cidadão que faz o serviço militar é obrigado a manter sua arma em casa; são armas militares portanto - fuzis de assalto e metralhadoras. Já no Canadá, a maioria das armas entre a população são fuzis e espingardas esportivas (para caça ou tiro ao alvo). Suiça e Canadá possuem baixíssimos índices de criminalidade. Uma curiosidade: apesar da grande quantidade de armas, apenas 2% dos assassinatos no Canadá são cometidos com armas de fogo.
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O local mais armado do mundo é o estado da Flórida nos EUA (fora das zonas de guerra). Lá 630 mil pessoas portam armas legalmente. Apesar disso, não nos consta que algum brasileiro tenha deixado de ir ao Disneyworld ou fazer compras em Miami por este motivo (nem mesmo os militantes do movimento Sou da Paz).
Se isso representasse um perigo, as agências de viagens deveriam ensinar a seus clientes o significado da palavra "freeze".
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31 estados dos EUA, compreendendo mais de 50% da população do país, possuem leis "shall issue", isto é: o estado não pode negar o porte de arma a um cidadão que não apresenta maus antecedentes. Todos os estados que implantaram essas leis tiveram redução nos índices de criminalidade.
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Caso queira fazer alguma pergunta baseada nesses dados esteja à vontade.
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Para Marceu Vieira - Revista Época
Abaixo segue texto contendo breve comentário sobre a política adotada pelo governador do estado do Rio de Janeiro
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Até quando os políticos pensam poder enganar o povo?
A nova política de segurança pública do governador Garotinho, centrada no combate a objetos inanimados - as armas - está fadada ao fracasso.
Como não é possível "desinventar" as armas ou impedir seu fluxo para o estado, já vemos aí a futura desculpa para o insucesso.
Até uma criança deveria saber que o mal está nos homens e não em seus objetos.
Que efeito pode ter essa campanha sobre a criminalidade - além de provocar risos nos bandidos?
O que o governador do RJ está fazendo é constranger os cidadãos honestos (eleitores) que nenhum mal causam com suas armas. Desde quando bandido compra arma em loja e tem arma registrada em seu nome?
No Rio Grande do Sul são concedidas cerca de 34 mil licenças de porte de arma por ano, nem por isso os gaúchos andam se matando. (*) Segundo a tese do professor John Lott Jr., da Universidade de Chicago e autor do livro "Mais Armas, Menos Crimes", talvez seja por isso que Porto Alegre é uma cidade mais tranqüila que o Rio e São Paulo.

(*) fonte: Secretaria de Segurança Pública do RS.

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