divulgado em 11/NOV/98
Entrevista ao JORNAL DA TARDE
Abaixo segue a transcrição integral da entrevista dada
pelo editor do ARMARIA à jornalista Patrícia Ferraz do
Jornal da Tarde de São Paulo.
A entrevista foi publicada no caderno Domingo do dia
08/11/98. O tema da reportagem foi o próximo lançamento
no Brasil do livro "Mais Armas, Menos Crimes" do prof.
John Lott Jr.
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1 - Porque o senhor acredita que armar a população é a melhor maneira de combater a violência?
R - Não é que seja a melhor maneira. É apenas mais uma
medida que se pode tomar nesse sentido.
Pesquisas empíricas
mostram que um certo percentual de cidadãos armados exerce
um efeito inibidor na criminalidade comum. Os efeitos já
se fazem sentir com algo em torno de 5% da população armada.
2 - O que o senhor pleiteia exatamente, já que a legislação brasileira está entre as mais permissivas do mundo em relação à compra e posse de armas de fogo ?
R - Discordo totalmente dessa afirmativa. Desde 1936 temos uma das mais rigorosas legislações sobre armas do mundo. Nós temos restrições de calibres, de número de armas, de funcionamento (das armas), para a compra de munição e para o transporte. Além disso, o porte de arma é praticamente proibido em todo país e o registro de toda arma de fogo é obrigatório. O cidadão que quizer comprar uma arma tem que comprovar bons antecedentes, estar empregado e ter residência fixa. Ainda por cima será fichado na polícia e terá de pagar as maiores alícotas de impostos do mundo. É por causa dessa complicação que temos um pujante mercado negro de armas.
2-a De que forma o senhor sugere que se dê o armamento da população?
R - Ninguém deve ser obrigado ter arma em casa, como na Suiça, ou a andar armado. O que pleiteamos é uma legislação que permita àqueles que desejarem andar armados, e se qualificarem para tal, obterem a licença de porte de arma com a polícia. Isso não é nenhum pleito absurdo. O porte de arma era bastante comum em nosso país até a alguns anos atrás.
3 - O senhor se baseia na tese do prof. John Lott, que revela a realidade norte-americana. Do ponto de vista da questão do armamento, o que há em comum entre Brasil e Estados Unidos e o que há de diferente? É possível supor que o que funciona num país como os Estados Unidos pode funcionar no Brasil em relação à violência e criminalidade? O senhor tem números sobre a realidade brasileira e exemplos que mostrem que a tese se aplica também ao Brasil?
R - Vamos por partes. Não me baseio apenas no trabalho do
prof. Lott. A primeira pesquisa séria sobre a influência do
cidadão armado sobre a criminalidade ocorreu nos EUA durante
o governo Jimmy Carter e foi patrocinada pelo departamento
(ministério) de justiça. É o conhecido Relatório Wright-Rossi.
Depois deste surgiram inúmeros outros. O professor Gary Kleck,
da Universidade da Flórida, por exemplo, publicou inúmeros
trabalhos sobre o tema, inclusive vários premiados pela
Associação Norte Americana de Criminologia.
Quanto a questão da realidade americana, entendo que o ser
humano é igual em todo o mundo. Nossas ambições, nossos
temores e reações são iguais seja na China ou no Brasil.
Os cidadãos americanos são apenas mais ricos que nós.
Sobre esse assunto, aliás, Israel é um bom exemplo de como
uma sociedade armada, mesmo cheia de problemas, pode
apresentar baixos índices de criminalidade.
No Brasil não há pesquisas confiáveis sobre o assunto.
Não interessa ao governo estudá-lo e as ONGs que se dedicam
ao tema não têm isenção suficiente para tornar crível seus
resultados. Suas pesquisas já começam com resultados
definidos.
3a- O senhor acompanha a questão de armamento em todo o mundo, poderia citar exemplos de outros países, além dos Estados Unidos, onde o armamento resultou na redução da criminalidade?
R - Posso citar exemplos contrários, como a Inglaterra
e a Austrália, onde a recente redução do número de armas
na comunidade levou a um aumento na criminalidade.
Simplesmente não existe exemplo onde uma lei sobre armas
tenha resultado na diminuição da criminalidade.
Na Inglaterra, desde 1988, surgiram inúmeras leis
restringindo cada vez mais a posse de armas por civis.
Entre 1988 e 1992 o número de armas legalmente possuídas
no país baixou 25%. Nesse mesmo período, os crimes violentos
aumentaram 29,1% e o roubo a mão armada, em particular,
aumentou 117%.
Na Austrália, no ano passado, foram proibidos
diversos tipos de armas e o governo recomprou dos cidadãos
640 mil armas. O resultado é que os crimes com armas de fogo
aumentaram 28% e os roubos a mão armada aumentaram 39%.
Curiosamente esses dados não aparecem em nossa imprensa,
apesar de divulgados internacionalmente pelas grandes
agências de notícias.
(Nota: quando repondemos a esta pergunta ainda não tínhamos
em mãos os números do aumento da criminalidade em São Paulo
neste ano (1998), senão poderíamos citar esta cidade como
exemplo dos efeitos nocivos do desarmamento).
4 - Armar a população para combater crimes não é transferir ao cidadão comum uma atribuição do governo, que é garantir a segurança?
R - Esse é um falso dilema. O governo não pode botar um guarda em cada esquina. Quem iria pagar por isso? Além disso, o estado não pode ser responsabilizado por não impedir um crime, nem mesmo quando cometido por presos em regime de liberdade condicional. Quem quer se tornar uma estatística?
5 - O senhor se envolveu numa polêmica recente com o secretário dos Direitos Humanos, José Gregori. O que houve e porque o senhor acha que o governo federal está em campanha pelo desarmamento da população? Questão ideológica? Aponte alguns dos motivos, por favor. Em sua opinião, porque a ONU e diversos países têm campanhas a favor do desarmamento?
R - Foi uma falsa polêmica criada pelo jornal Correio
Brasiliense. Segundo este jornal, que fez uma reportagem
sobre nosso web-sítio na internet, ele teria dito que ia
mandar a Polícia Federal investigar a origem de nossas armas
porque estavamos incentivando o porte ilegal de armas. Ora,
isso é um mal entendido. Nós também somos contra o porte
ilegal de armas. Vimos claramente na televisão que o Sr.
Gregori referia-se ao porte ilegal. Assim como o jornal
omitiu a palavra "ilegal" na reportagem, provavelmente o
jornalista forneceu dados errados a nosso respeito para o
Secretário. Não seria crível que o Secretário de Direitos
Humanos do Ministério da Justiça fosse perseguir um grupo
de pessoas apenas por discordarem do governo. Afinal, a
livre manifestação do pensamento está garantida na
constituição. Para nós o assunto está encerrado.
A impressão que temos hoje, é que essa política
governamental de desarmamento é imposta do exterior.
No Brasil sempre houve leis rigorosas proibindo armas.
Nós não temos um problema de armas no país. Nosso presidente,
por exemplo, anda em automóvel com blindagem leve e nossas
autoridades raramente usam coletes à prova de balas.
Nosso problema é de banditismo, mas isso não se cura com mais leis
e sim com vontade política.
De fato, esse movimento contra armas é mundial e,
tirando-se os inocentes úteis de sempre, vejo isso como um
complemento à política de re-colonisação imposta ao terceiro
mundo pelos países hegemônicos. Digamos que não é seguro
investir num país onde a população está faminta e armada.
Aumenta a taxa de risco. A ONU o BIRD a OEA, etc., todos
esses organismos internacionais estão agindo da mesma forma.
É o tal do "consenso". Mas cada país aceita ou não esse
receituário. A Argentina, por exemplo, resiste a essas
pressões, mas Brasil e México capitularam.
6 - Pesquisa divulgada pela ONU no ano passado apontou o Brasil como o país campeão em porcentagem de mortes causadas por arma de fogo com o índice de 26,5 mortes em cada 100 mil habitantes, uma taxa 5,5 vezes maior do que a média mundial. O Japão está no lado oposto, de acordo com o estudo o Japão é o país com menor taxa de mortalidade envolvendo armas de fogo 0,05 por 100 mil habitantes. Além da porcentagem de mortes há outra grande diferença entre os dois países: a legislação. No Japão, o cidadão comum não pode ter arma de fogo. No Brasil, ao contrário, basta ter 21 anos para poder comprar uma arma de fogo, a lei garante o direito de posse de arma até a criminosos condenados - depois de cumprir a pena, eles voltam a ter o direito de ter uma arma de fogo. A diferença na lei não seria o argumento em favor da tese contrária à sua, ou seja, ao armamento da população?
R- Essas pesquisas não têm nenhuma relação com a posse legal
de armas. A maioria desses homicídios ocorreu em confrontos
com a polícia ou brigas de quadrilhas.
O dado que nos interessa é: quantos desses homicídios foram cometidos com
armas registradas? Quantos foram cometidos por cidadãos sem
passagem prévia pela polícia? Se esmiuçarmos a fundo esses
dados veremos que esses casos são raríssimos. Esses números
apavorantes só mostram que estamos tendo um sério problema
de banditismo. O cidadão comum não mata. A posse de uma arma
não transforma ninguém em assassino.
Mas, quero lembrar que essa mesma pesquisa da ONU apresenta
erros crassos. Por exemplo, eles dizem que o país mais armado
do mundo é a Alemanha, o que não é verdade, e um país como
a Jamaica, com alta taxa de assassinatos políticos, nem
aparece na relação. Que credibilidade têm esses números?
Quanto ao Japão, é bom lembrar que a Yakusa (a máfia japonesa)
anda muito bem armada e que com 500 dólares na mão é fácil
comprar uma pistola chinesa nas ruas de Tóquio. Certamente
não é por falta de armas que não acontecem crimes no Japão.
Lá como cá existe um mercado negro de armas que abastece a
marginalidade. Lá como cá os criminosos adquirem suas armas
por meios ilícitos. Aliás, no Brasil, uma arma no mercado
negro costuma custar menos da metade do que sua similar no
comércio legal, tamanha é a abundância. A culpa disso é da
política de armas equivocada do governo.
7- Em sua opinião qualquer pessoa é apta a usar armas de fogo? E ainda: qualquer pessoa tem condições psicológicas e preparo técnico para reagir, por exemplo, a um assalto, situação em que o bandido tem a vantagem da supresa?
R - Não! O ARMARIA não recomenda ou aconselha ninguém a
comprar ou usar armas. É uma decisão de foro íntimo de
cada um. Sem dúvida, para andar armado nas ruas é preciso
ter um perfil psicológico adequado. O que nós defendemos é
o DIREITO DE TER ARMAS.
Quanto a essa questão da surpresa,
ela é superestimada no Brasil. Diversas pesquisas realizadas
nos EUA mostram que o cidadão que reage com arma de fogo
tem maior chance de sair ileso em confronto com criminosos
do que os que adotam a postura de submissão recomendada
pelas autoridades. O professor Gary Kleck, por exemplo,
mostrou em seus trabalhos que 70% das vezes em que os cidadãos
usam suas armas para evitar uma violência não chega a ser
disparado nenhum tiro. A mera presença da arma inibe a ação
criminosa.
8 - O armamento da população não implicaria em aumento de mortes em brigas de trânsito, de rua, de bar, de gangues, de jovens, de casais enfim... ainda que houvesse a redução da quantidade de crimes violentos, o senhor não acha que a situação acabaria provocando mais mortes? O senhor tem algum estudo envolvendo essa questão?
R - Essa é a verdadeira questão que nossas autoridades se recusam a discutir. A presença de armas na sociedade traz mais vantagens ou desvantagens? Os crimes inibidos ou interrompidos são em maior número que os acidentes e os crimes passionais? Ou não? Eu acho que a recusa em discutir esse assunto é porque eles sabem que todos os estudos apontam para um balanço francamente favorável ao uso de armas. Está aí o recente estudo do professor Lott mostrando com fatos e dados essa relação.
9 - Em sua opinião, uma pessoa sem antecedentes criminais que comete um crime usando arma de fogo acaba atirando porque possui a arma ou já compra a arma porque tem a intenção de matar?
R - Esses eventos são extremamente raros. Quando acontecem a imprensa faz um tremendo carnaval a respeito mas, estatisticamente falando, são desprezíveis. Certamente ninguém mata outra pessoa apenas porque tem uma arma. Já pensou que risco seria fazer o serviço militar com tanta gente armada nos quartéis? O desejo de matar antecede o uso da arma.
10 - A que o senhor atribui a enorme polêmica que se cria cada vez que entra em discussão a questão do armamento da população para conter a violência urbana?
R - Infelizmente eu não vejo essa discussão acontecer. Não há polêmica. Simplesmente todo mundo é contra. Como dizia Nelson Rodrigues, toda unanimidade é burra. Para falar a verdade, essa entrevista para um jornal de primeira linha, para mim, foi uma agradável surpresa.
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